Páginas

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

POR QUE O LAICISMO É IMPORTANTE?



Texto: Tarsila
Sou profissional de saúde. Mais especificamente, biomédica (em formação). Embora eu tenha escolhido o curso para evitar o contato com pacientes, posso atuar com eles – uma das especializações é perfusão extra-corpórea. Para não me prolongar, perfusão é um procedimento em que o coração do paciente precisa parar e circular através de uma máquina, e é papel do perfusionista “comandar” isso, como o anestesiologista monitora a anestesia durante a cirurgia inteira. É de responsabilidade imensa – literalmente, a vida do paciente está nas mãos do perfusionista.

Agora, imagine você, leitor: uma albina deita na maca e eu não gosto de albinos. Eu acho que eles ferem os bons costumes das quais sou adepta. Por quê? Porque eles são diferentes, oras. Você viu a bíblia falar bem de albinos? Não. Pois eu acho que todos eles deveriam morrer.
Se você vir me dizer que eles escolheram ser albinos… não, senhor. Por que eles não tomam sol? É tão simples! Eles QUEREM ser albinos. Não vem me dizer que eles não podem tomar sol porque é mentira. Eles querem nos assaltar com suas peles e cabelos claríssimos.
Por odiar tanto os albinos, causo uma “falha do aparelho” durante a cirurgia. O sangue do paciente para de circular por alguns instantes e ele tem falhas neurológicas ao acordar da anestesia.
Parece absurdo, mas acontece o tempo todo – com negros, gays, obesos, pobres. Acontece o tempo todo na medicina, na justiça, no comércio, nas universidades. É fácil julgar e se esconder por trás de uma máscara repleta de ignorância, invocar seres que nem sabemos se existem, citar livros mitológicos escritos milhares de anos atrás por sabe-se lá quem e traduzidos e passados adiante por pessoas que jamais chegaremos a ter notícia. É o que acontece, por exemplo, com os gays que têm o casamento anulado por juízes que dizem que “foi deus que mandou”. É o que acontece quando pessoas esperam uma cura para suas doenças, doenças cujo sofrimento causado jamais será tangível para a maioria de nós – paraplegia, danos neurológicos, leucemia – e vêem a medicina e a pesquisa ser atrasada porque “pesquisa com células-tronco é coisa do demônio”.
Ao mesmo tempo, vemos as seguintes imagens: um Papa cujas roupas são tecidas com fios de ouro (nem preciso falar que o mesmo se aplica à coroa) e uma realidade vivida por boa parte da sociedade brasileira:




Acredite se quiser, o título da foto do papa é “Papa discrimina homossexuais”.


Isso me faz perguntar por que atrasamos a pesquisa, traímos a legislação e espalhamos o preconceito por uma instituição que pouco fez e pouco faz à sociedade brasileira. E antes fosse a Igreja Católica a única a usufruir da falta de instrução do povo: A Igreja Evangélica e ramificações (Universal, Reino de Deus, adicione mais umas 200 entidades lucrativas aqui), além de não ajudar pessoas em situação como a criança da foto, fazem de tudo a seu alcance para sugar o dinheiro dos que já têm pouco e expõem seus fiéis a situações de constrangimento extremo, vide o pastor que obrigou uma mulher a reconstituir o hímen (que havia sido rompido por uso de absorvente interno) antes do casamento.
Ao menos a mim, fica evidente a necessidade do laicismo no Estado. Aos mal-informados, Bolsonaros e trolls de plantão, o laicismo não é “favorecer os ateus” ou “ser ateu”. Você pode ser um religioso laico, basta não tratar os OUTROS baseado na SUA religião. O laicismo é a ausência de religião no Estado – seja catolicismo, protestantismo, judaísmo ou o que quer que seja. Não mais podemos julgar as pessoas com base na religião, não mais podemos criar leis com base em livros mitológicos.
Antes que eu seja trollada por pessoas dizendo que isso trai a “família e os bons costumes”, quero deixar bem claro que o laicismo não está associado com a quebra de entidades como a família. Conheço casais ateus, famílias inteiras ateias. O laicismo e o casamento gay não significa que você pode sair na rua pelado ejaculando na cara de quem você quiser. E a ausência do laicismo também não configura o contrário – o carnaval, que nada tem de “moral e bons costumes”, existe nesse país bem antes dos católicos deixarem de ser uma grande maioria da sociedade.


Por isso, escrevi esse texto defendendo o laicismo. Se não podemos tê-lo na política, vamos o cultivar no trabalho, na sociedade, nas universidades, enfim. Um mundo laico e sem preconceito é um mundo melhor =

Veja mais em:
http://www.sociedaderacionalista.org

Nenhum comentário:

Postar um comentário