sábado, 12 de novembro de 2011
TEORIAS DE CONSPIRAÇÕES: BESTEIRAS
A ideia de que vivemos num mundo caótico em que os nossos “líderes” — governantes de países e grandes empresários de multinacionais — não sabem, em grande parte, o que estão fazendo, é, para muita gente, o assustador futuro que se pode ter. É, de certa forma, o equivalente a uma criança pequena perceber que pela primeira vez na vida seus pais não têm todas as respostas, e que muitas vezes nem estão em sintonia um com o outro; que não há ninguém absolutamente competente para cuidar de nós. É um terror básico, que não desaparece totalmente pelo simples fato de chegarmos à idade adulta. O ser humano, em certos aspectos, nunca cresce totalmente: continuamos a necessitar, em diversos graus, de nos sentir seguros, de sentir que há ordem no universo, de que há um plano, de que há uma espécie de “pai” que cuida de nós — mesmo que muitas vezes não o entendamos, que os seus objetivos nos sejam em grande parte incompreensíveis e que ele nos pareça muito cruel.
Não, não estou falando de religião, se bem que tudo o que escrevi acima é perfeitamente aplicável também pra visão religiosa. Nesse texto eu mudei o alvo dos meus ataques, e vou falar sobre a ideia de teorias de conspiração: a ideia de que há certos “Chefes do mundo”, normalmente sob a forma de uma organização ultra-secreta — tão secreta que a maioria das pessoas nunca ouviu falar dela — que controlam, a partir das sombras, o avanço e o destino da humanidade, estando acima de presidentes e outros líderes “visíveis” e que isto é assim há séculos, ou mesmo milênios.
Para um crente das teorias de conspiração, tudo o que acontece — os resultados de uma eleição, um golpe de Estado, uma crise econômica, uma celebridade assassinada, ou mesmo um avanço científico – só acontece porque essa organização que domina o mundo quis assim, de acordo com o seu plano de dominar o mundo. Essa organização controla tudo, são absolutamente competentes, e é virtualmente impossível frustrar os seus planos — sobretudo porque a maioria dos “carneiros” desconhece que eles sequer existem, vivendo felizes na sua ignorância. E a organização é, obviamente, muito eficiente a fazer desaparecer evidências (ou pessoas); afinal, fazem isso há centenas de anos. E todos os eventos registrados na História têm um significado diferente, quando interpretados sob este ponto de vista.
Mais incrivelmente, quando confrontados com a falta de evidência para justificar a sua crença de que os Illuminati, a Maçonaria, os Bilderberg e afins controlam o destino da humanidade, os crentes nas teorias de conspiração têm na ponta da língua a resposta, a seu ver, perfeita:
“Isto só prova que eles são absolutamente competentes e mantém oculta a sua influência, e em certos casos até mesmo sua existência.”
Tal como na citação no início do post, a prova de que eles existem é que não os conseguimos detectar a existência deles. A prova de que controlam tudo é que não conseguimos sequer ver esse controle. E a explicação para tanta “eficiência”? Intenções sinistras, é claro.
É uma lógica curiosa: quanto menos evidências existem deles, mais competentes e malignos são; logo, se não há evidências, são extremamente competentes e malignos. A ideia de que não há evidências também pode, sei lá, quem sabe, indicar que realmente não existem (ou, em casos como a Maçonaria, não têm o poder nem fazem as coisas que lhes são atribuídas) nem lhes parece passar pela cabeça…
Possivelmente, alguns crentes das teorias de conspiração até se consideram céticos, isto é, não acreditam cegamente, dizem eles, na “versão comum” da História, da política, de como a humanidade progride. Mas isto é um erro. O verdadeiro ceticismo baseia-se em escolher e escalar as nossas crenças de acordo com as evidências disponíveis, e não em rejeitar toda e qualquer evidência contrária a uma crença pré-assumida, ou pior ainda: em reinterpretar a ausência de evidência a favor dessa crença como “prova” de que ela é válida (?). E é isto que um crente na teoria de conspiração efetivamente faz. Depois de construir a sua crença, não há evidências contra essa crença que surtam qualquer efeito; tudo pode ser reinterpretado como “isso é o que eles querem que pensemos!“. Por outro lado, qualquer ponto aparentemente a favor dessa crença, por mais “rebuscado” que seja, serve-lhe de confirmação — mais do que suficiente — de que ela é legítima. Isto, como espero ser óbvio, não é uma forma nem científica, nem cética, nem intelectualmente honesta de ver as coisas.
E com isso lanço um desafio a qualquer crente na teoria de conspiração que leia isto e não concorde com a minha posição. O desafio é: há alguma coisa, algum tipo de evidência, que te fizesse admitir que estivesse errado/a, que as tuas crenças sobre conspirações e organizações ultra-secretas são infundadas, que o mundo realmente é caótico, os nossos “líderes” são na sua maioria mais ou menos incompetentes, e não há qualquer “plano” a ser mantido cuidadosamente por um grupo sombrio?
Se não há, se qualquer possível evidência que te fornecessem seria imediatamente reinterpretada como “isso é o que eles querem que se pense” (confirmando, dessa forma, ainda mais a sua posição), se a tua crença é completamente imune à realidade, então de onde é que ela realmente vem? Será de um medo de viveres num mundo caótico onde as coisas acontecem muitas vezes sem explicação, sem fazerem parte de um plano? Ou é simplesmente porque você quer se sentir “especial” ao ser o único, ou dos pouquíssimos únicos, que sabe a “verdade” por trás das coisas enquanto o resto da humanidade não passa de “carneiros” iludidos? Pensa bem. É que acabou de demonstrar que não existem fatos, nem evidências, de uma observação honesta do mundo… o que faz de você o oposto de um “cético”: um crente dogmático, que escolhe e mantém determinadas crenças apenas porque isso te faz sentir bem.
Por: Kaio Costa
Veja mais em: http://sociedaderacionalista.org
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