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domingo, 9 de outubro de 2011

O ateísmo e a moral



Uma das mais abundantes afrontas ao ateísmo tem sido a de que este é danoso para a sociedade. Não raro, na televisão, nas redes sociais e nas conversas entre amigos, a afirmação é levantada. Em alguns casos, atribui-se ao ateísmo todos os males da sociedade. Ignora-se habilmente a motivação religiosa de ataques terroristas, guerras e massacres e difunde-se o bordão “a falta de deus é a causa de todos os males”. Em outros, vemos o medo perante o aumento do número de ateus nas sociedades, ignorando-se, mais habilmente ainda, a pesquisa que afirma que quanto menor o nível de religiosidade de um país, maior o seu IDH.

Recentemente, li este texto, que afirma, em suas considerações finais, o seguinte:

As conseqüências do ateísmo são ainda mais prejudiciais à sociedade. Suprimindo as idéias de justiça e de responsabilidade, o ateísmo leva os Estados ao despotismo e à anarquia, e o direito é substituído pela força. Se os governantes não vêem acima de si um Senhor que lhes pedirá contas da sua administração, governarão a sociedade segundo os seus caprichos. Mais ainda, os homens, na realidade, não são todos iguais nas honras, nas riquezas, nas situações e nas dignidades. Ora, se não existe um Deus para recompensar um dia os mais deserdados da fortuna, que cumprem animosamente o seu dever e aceitam com resignação as provas da vida, porque não haveriam de se revoltar contra um mundo e uma sociedade injusta e reclamar para si, a todo custo, o seu quinhão de felicidade e prazer?

Meu objetivo não é discutir esse texto em especial, mas sim suas ideias, que são as mesmas berradas aos sete ventos por conservadores e fundamentalistas: a de que o ateu, já que não tem nenhum “ser superior o vigiando”, agirá como bem entender; a de que realizaremos carnificinas pelo dinheiro, a felicidade, o prazer.

Sim: nós, ateus, agimos como bem entendemos. Cremos que não há nenhum ser superior que reclame por nossos atos, pensamentos e sentimentos. Por que o livre-arbítrio, nesse caso, haveria de nos dirigir para o mal? Além disso, os religiosos contam com o mesmo livre-arbítrio, já que confiam no “perdão de deus”. Para todo pecador – seja qual for seu pecado: roubo, estupro, assassinato – que se arrepender, deus garantirá seu perdão. Isso justifica e explica muito bem os inúmeros crimes praticados por religiosos: guerras, casos de pedofilia na ICAR (e, recentemente, na IURD), casos de freiras estupradas, em 23 países, que têm sido habilmente ocultados pelo Vaticano, entre outros. Ora, acreditar no perdão incondicional e acreditar puramente no livre-arbítrio, em termos práticos, dá na mesma: cada um faz o que bem entende. Os ateus e agnósticos que agem de boa índole, realizam ações humanitárias e agem com respeito em suas relações não o fazem por temer a um ser imaginário – fazem porque o querem. Na minha opinião, essa é a virtude verdadeira: aquela que não espera o “reino dos céus”, o paraíso, anjos cantando e um lugar bem bonito após a morte; age puramente pela vontade de fazer o bem.

Ora, já que não somos “tementes a deus”, por que não esculhambamos o mundo de uma vez? Por que não roubamos, estupramos, entramos em depressão por não acreditar na vida eterna? A maioria dos ateus que conheço age ao contrário justamente por isso: acreditamos que esta seja a única oportunidade de deixarmos nossa marca no mundo. O que eu me pergunto é exatamente ao contrário: se você acredita na justiça divina, por que mudar as coisas na Terra? Aliás, se deus é onipotente, por que ajudar quem precisa? Ele certamente colocou os carentes lá por algum motivo. Por que tentar descobrir uma cura para o câncer, se deus tem o poder de remover essa doença para o mundo?

Certamente, religião – bem como sua ausência – não define caráter. Ações humanitárias devem ser realizadas independentemente da crença de cada um – e respeito, também. O ateísmo, a religião x ou y e seus fiéis não são a razão dos males de um mundo composto por diferenças religiosas, filosóficas, sexuais, intelectuais. A razão dos conflitos está, sim, na ignorância, a intolerância e o desrespeito às diferenças.

Por: Tarsila
Veja mais em:
http://sociedaderacionalista.org

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